sábado, 27 de outubro de 2012

E aí? Tira é pra ser engraçada ou pra fazer pensar?



Por Liriane Kampf

Essa foi uma das questões discutidas no debate sobre tiras, realizado na tarde de sábado, 27, no Paço da Liberdade. O evento fez parte da programação da Convenção Internacional de Quadrinhos de Curitiba, a Gibicon.

Com participação dos desenhistas Pryscila, Benett, João Montanaro, Jean Galvão e Fernando Gonsales, e mediação do jornalista Paulo Ramos, foram discutidas questões sobre as possibilidades da narrativa horizontal, os limites da reprodução na internet, criação e desenvolvimento de traços e como a opinião dos leitores influenciam na criação das tiras. Além das perguntas lançadas pelo mediador, os cartunistas responderam, também, perguntas feitas pela plateia do evento.

Uma das questões expostas foi sobre o sustento a partir do trabalho com tiras. Os convidados foram unânimes: não dá pra viver só da publicação em jornais. É necessário buscar outras fontes de renda como agências de publicidade, revistas, ou trabalhos freelancers de ilustração. “Não dá nem pra comprar iogurte”, brinca Pryscila, cuja principal fonte de sustento provém da publicidade. João Montanaro, caçula da turma, com apenas 16 anos, explica que se não morasse com os pais, também não teria como se sustentar.

Paulo Ramos, professor da Unifesp e da USP, comentou sobre a mudança do local de publicação das tiras. Durante o século 20, o jornal foi o principal divulgador do trabalho dos cartunistas. Já no século 21, houve a migração do jornal para a internet. João explicou que um de seus famosos cartoons (aquele em que um menino aponta para um pássaro no parque e diz: “Olha, mãe, um twitter!”) foi publicado primeiro no jornal, mas só teve visibilidade quando foi para a internet. Todos concordam que a internet dá muita visibilidade, assim como afirmam que o jornal dá mais credibilidade ao trabalho do artista. Pryscila explicou que foi contratada para um emprego fixo como cartunista porque um editor viu seu trabalho na internet. “Tive oportunidade de viajar e expor no exterior porque viram meu trabalho no meu blog”.

Quando a questão é lidar com a opinião alheia sobre seu trabalho, Benett é taxativo: “Se uma tira minha faz muito sucesso, mudo de tema. Se não faz sucesso, aí é que insisto”. Fernando Gonsales, que já está no ramo dos quadrinhos há 27 anos, confessa que se sente influenciado. “Claro que tenho personalidade. É preciso ter um mínimo dela. Mas a opinião dos leitores faz grande diferença na hora de expor um tema ou ideia”.

E a pergunta que não quer calar: DE ONDE VOCÊS TIRAM AS IDEIAS PARA AS TIRAS? João explica que não tem fórmula, mas sim ingredientes. E Jean explica quais são: “Um bom repertório de influências, uma boa base de conhecimentos gerais, ler muito, entre outras coisas.” Já Benett é um pouco menos ortodoxo. “Uma vez sonhei que estava numa exposição de tiras de outros autores. Mas as tiras, na verdade, eram minhas. Quando acordei, lembrei todas as tiras, que eram uma porcaria. Só uma se salvou. Ainda bem que não eram minhas.”

E sobre o retorno dos fãs sobre seus trabalhos, as histórias variaram de emocionantes a inacreditáveis. Pryscila contou que recebeu uma carta de uma mulher que sofria violência doméstica. Na carta, a mulher contava que lia as tiras da Pryscila (que têm como personagem uma boneca inflável que pensa e fala) todos os dias, as recortava e colecionava, porque através daquelas tiras, ela sentia que podia responder ao marido de uma maneira que não tinha coragem de fazer. “Foi a coisa mais chocante e gratificante que já ouvi a respeito do meu trabalho”. A história inacreditável fica por conta de Benett. “fiz uma tira sobre um menino que não entendia metáforas. Nas tiras, ele era chamado de burro e tudo mais. Uns dias depois uma mãe me liga dizendo que o filho dela tinha uma síndrome rara e que, por conta desta síndrome, era incapaz de entender metáforas.”

Os convidados e a plateia com cerca de 40 pessoas que assistiu ao debate riram e refletiram a respeito das tiras, arte esta que encanta o mundo há mais de um século.

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